Equiparação entre cônjuges e companheiros: um paradoxo

Equiparação entre cônjuges e companheiros: um paradoxo

No dia 10 de maio de 2017 o Supremo Tribunal Federal concluiu julgamento conjunto dos Recursos Extraordinários ns. 646.721/RS e 878.694/MG, em que reconheceu, de forma incidental e por decisão não unânime, a inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil. Na ocasião, foi firmada a seguinte tese de repercussão geral (tema 809): “No sistema constitucional vigente é inconstitucional a diferenciação de regime sucessório entre cônjuges e companheiros devendo ser aplicado em ambos os casos o regime estabelecido no artigo 1829 do Código Civil.”

Quando do julgamento, os Ministros Dias Toffoli, Marco Aurélio de Mello e Ricardo Lewandowski ficaram vencidos, na medida em que negaram provimento aos reclamos por entenderem que o legislador não extrapolou os limites constitucionais ao incluir o companheiro na repartição da herança em situação diferenciada.

Na justificativa das divergências, referidos Ministros afirmaram, entre outras razões, que o plano sucessório diferenciado para o casamento e a união estável foi assim previsto pelo legislador para evitar a descaracterização dos dois institutos, não sendo possível igualá-los sob pena de suplantar o próprio casamento. Ressaltaram, também, que não cabe ao Poder Judiciário suprimir a manifestação de vontade dos particulares, sob pena de ferir o direito constitucionalmente previsto, qual seja: o da liberdade.

De outro lado, a maioria dos Ministros, ao decidir pela inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil, entendeu que o tratamento diferenciado ao direito sucessório do companheiro fere o princípio constitucional da igualdade.

Sendo assim, com a declaração de inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil não há mais distinção entre cônjuges e companheiros para fins sucessórios, devendo ser aplicado o regime do artigo 1.829 do Código Civil.

Contudo, não há como negar que o julgamento proferido pelo STF criou certa “situação paradoxal”, na medida em que ao mesmo tempo em que a União Estável e o Casamento foram equiparados, estes institutos são diferenciados.

Pois bem. Com a equiparação entre estas duas entidades familiar realizada pelo STF, questiona-se qual alternativa restará àquela pessoa que preferir viver em União Estável, e não casar? Certamente nenhuma, já que estaria em um instituto idêntico ao do casamento, embora com outra denominação, sendo desrespeitada a vontade das pessoas que optaram por não se casarem no civil.

Nas palavras do Presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IDBFAM, professor Rodrigo da Cunha Pereira (www.rodrigodacunha.adv.br/uniao-estavel-e-casamento-o-paradoxo-da-equiparacao-2): “O Estado não pode e não deve interferir na liberdade dos sujeitos de viver relações de natureza diferente daquelas por ele instituídas e desejadas.”

Nesse pensar, em tese, a maioria dos Ministros do STF acabou por aniquilar o instituto da União Estável (união livre), já que ele é escolhido pelos interessados justamente por não conter regras postas pelo Estado como no casamento, não obstante continue por ele protegida. As regras de convivência são criadas pelos próprios companheiros, sem intervenção estatal.

Anteriormente ao julgamento em questão existia clara diferença entre a União Estável e o Casamento, na medida em que o cônjuge era herdeiro necessário e o companheiro não, o que permitia a possibilidade de escolha do casal ao constituir uma família. Havia respeito à vontade das pessoas interessadas na relação e preservação das peculiaridades cada entidade familiar.

Enfim, data vênia do entendimento ao qual chegou a maioria dos Ministros do STF, com o resultado do julgamento dos Recursos Extraordinários ns. 646.721/RS e 878.694/MG, a Corte equiparou institutos diferenciados. Estabeleceu que as Uniões Estáveis agora são “casamentos forçados”, o que vai de encontro à própria essência desta entidade familiar que é a não submissão a determinadas regras postas.

Ana Varela Regges